Introdução
Para entender o porquê da importância de considerar tanto o custo de financiamento quanto os dias de cobertura, considere o seguinte exemplo: Você recebe dois pedidos de orçamento, um para a fabricação do equipamento A e outro para a fabricação do equipamento B. Sabendo que não é possível aceitar os dois pedidos, deveríamos produzir o equipamento A ou o equipamento B?
Considerando a abordagem tradicional de custeio, verificamos que ambos os equipamentos trariam o mesmo resultado (vide tabela abaixo)
No entanto, há uma teoria chamada "contabilidade baseada na Teoria das Restrições" que pode dar uma nova visão para esse problema.
O que a teoria fala
A Teoria das Restrições
Antes de falar sobre o que é a contabilidade baseada na teoria das restrições, vamos falar sobre a teoria propriamente dita. A teoria das restrições foi desenvolvida por Eli Goldratt no começo dos anos 80 e tem como principal contribuição o conceito de gargalo. No chão de fábrica, o gargalo é o recurso que limita todo o resto da produção. Por exemplo, considere uma fábrica fictícia que produz apenas um produto que necessariamente devem passar por duas etapas de fabricação. A primeira etapa é realizada na máquina A, enquanto a segunda é realizada na máquinas B. Considere que essas máquinas possuem as seguintes característica:
- Máquina A produz 10 peças/hora
- Máquina B produz 20 peças/hora
Nesse caso, a máquina A é o gargalo da nossa produção, ou seja, se investirmos na máquina B para aumentar sua produção para 25 peças/hora, a capacidade de produção da empresa não irá aumentar pois a máquina A impede que a máquina B produza mais peças. No entanto, se aumentarmos a capacidade de produção da máquina A para 25 peças/hora conseguiremos aumentar a produção para 20 peças por hora e a máquina B se torna o novo gargalo do nosso chão de fábrica. Para quem desejar conhecer mais sobre o assunto, uma excelente referência é o livro "A Meta", escrito pelo próprio Goldratt (link para o livro)
Considerando tudo isso, a teoria das restrições promove a identificação e eliminação do gargalo para melhorar efetivamente a capacidade de produção da empresa.
A Contabilidade da teoria das restrições
O lucro bruto de um produto é tradicionalmente definido como a receita gerada pela venda desse produto subtraído pelos custos que estão diretamente ligados à produção, como por exemplo, o custo da mão-de-obra envolvido na sua produção, assim como o custo dos materiais e insumos utilizados. Uma grande diferença da contabilidade baseada na teoria das restrições é que esta considera como variáveis apenas os custos que são verdadeiramente variáveis com a produção. Por exemplo, a mão-de-obra do time da produção não é considerado um custo verdadeiramente variável, pois há o raciocínio que dificilmente é possível variar a mão-de-obra da produção no curto prazo (principalmente, se pensarmos em sua redução), ou seja, se no curto prazo houver um período de baixa demanda, mesmo que não haja muito serviço, pode ser muito difícil dispensar trabalhadores.
Para a contabilidade baseada na teoria das restrições mais do que ter um lucro gordo, é importante haver foco no tempo que esse lucro irá levar virar caixa. Ou seja, tempo é uma variável que representa a eficiência da empresa de converter suas vendas em caixa.
O tempo como custo verdadeiramente variável
Como o tempo se mostrou muito importante no problema de orçamento para ambientes de produção complexos (jobshop), busquei definir quais eram os custos verdadeiramente variáveis relacionados ao tempo de produção do equipamento. A partir dessa reflexão, cheguei em dois: o custo de financeiro para produção do equipamento e o custo do risco ociosidade. Embora o custo financeiro do equipamento seja simples de definir, o segundo já é mais subjetivo, e por isso o risco de ociosidade foi considerado como uma nova dimensão de análise, representado pelo que definimos como dias de cobertura.
Para entender o custo financeiro, considere que você irá tomar um empréstimo no banco a fim de financiar 100% da sua produção, independente de qual pedido seja aceito. O banco irá cobrar uma taxa de juros proporcional ao tempo que você passa com o dinheiro. Dessa forma, quanto mais tempo levar para fabricar o equipamento, maior será o juros cobrado pelo banco. Seguindo esse raciocínio, vemos que o equipamento A tem um custo financeiro maior.
Por outro lado, considere um período de crise, em que a quantidade de pedidos está escassa. Nesse caso, se o equipamento B for escolhido para ser produzido, há o risco de terminar a fabricação do equipamento no meio do mês e ficar sem serviço pelo resto do mês. Já se o equipamento A for escolhido para ser produzido, a produção terá serviço por mais tempo, cobrindo as despesas operacionais por um período maior, e consequentemente, garantindo um fôlego maior para a empresa conseguir novos pedidos. Dessa forma, o equipamento B tem menos dias de cobertura.
Considerações finais
Embora não seja comum considerar custos financeiros no orçamento de um equipamento, ele é um custo bastante relevante para ambientes de produção complexos, em que a empresa irá levar semanas ou até meses para conseguir converter o pedido em dinheiro. No nosso projeto, verificamos que se fosse possível reduzir o custo financeiro em 1%, isso poderia gerar ganhos de até 20% no lucro operacional do equipamento.
Outra questão que geralmente não é levada em conta na abordagem tradicional, são os dias de cobertura, ou seja, por quanto tempo a venda de um equipamento consegue manter as contas em dia? Em nosso projeto, verificamos alguns produtos do portfólio que não trazem lucros interessantes, mas por levar meses para ser concluído, ele é uma opção interessante em tempos de demanda escassa.